EM PORTUGUÊS (NÃO) NOS ENTENDEMOS

Em entrevista à Lusa, o primeiro-ministro timorense, Xanana Gusmão, admite que o ensino do português em Timor-Leste “não é fácil”, um problema que justifica também com a história. Será? “O domínio do português foi interrompido por 24 anos e era proibido, e quem sabia um bocado de português era morto para não criar uma sociedade com tendências”, recorda, referindo-se à ocupação Indonésia.

Por Orlando Castro

Eu sei que mudam-se os tempos e mudam-se as vontades. Se até se muda, ou se abdica, da coluna vertebral… pouco resta. Mesmo assim…

Quando em Fevereiro de 1999 entrevistei Xanana Gusmão, à pergunta “que papel fica reservado para Portugal?” respondeu: “Um papel importante. Portugal é importante, como sempre o foi. Acreditamos que, mais uma vez, Portugal vai ajudar os timorenses a encontrar o caminho certo. Por isso, nunca é demais agradecer a ajuda de Portugal e dos portugueses. Esperamos que nesta hora difícil e crítica para a nossa Pátria, os portugueses continuem a ajudar-nos”.

A prova de que Xanana Gusmão está grato a Portugal é visível, ainda mais visível, no facto de o Governo timorense, por ele liderado, ter querido, em 2011, eliminar a Língua Portuguesa do sistema de ensino básico em Timor-Leste.

Em 2023, o secretário executivo desse elefante branco que dá pelo nome de CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, Zacarias da Costa, disse que o Governo de Timor-Leste queria consolidar a língua portuguesa. Será? Hum!

No final de um encontro com o primeiro-ministro timorense, Xanana Gusmão, o secretário executivo da CPLP, Zacarias da Costa, disse que foi debatido “um ponto muito importante que é a consolidação da língua portuguesa em Timor-Leste”.

“O primeiro-ministro informou-me que o Governo está empenhado em apoiar o projecto CAFÉ e continuar a formação de formadores”, afirmou Zacarias da Costa, referindo-se aos Centros de Aprendizagem e Formação Escolar, da cooperação portuguesa.

A consolidação da língua portuguesa é “uma preocupação que o primeiro-ministro manifestou”, disse, adiantando: “estamos a trabalhar todos juntos com alguns estados-membros, nomeadamente Portugal e Brasil, para que esse apoio, à consolidação da língua portuguesa, ou esse reforço, possa ser uma realidade num futuro próximo”.

O secretário executivo da CPLP disse também que Xanana Gusmão reiterou o “envolvimento e o empenhamento de Timor-Leste” na organização.

“Foi uma reunião muito importante. O primeiro-ministro revelou-se uma pessoa muito atenta e conhecedora dos acontecimentos na CPLP, particularmente desde a última cimeira”, afirmou.

Durante o encontro, foram também abordados temas como a juventude, os jogos da CPLP, que Timor-Leste deverá organizar em 2025, do programa de integração da Guiné Equatorial e sobre o fundo especial da CPLP.

A prova de que Xanana Gusmão estava grato a Portugal foi visível, ainda mais visível, no facto de em 2012 o Governo timorense, por ele liderado, querer eliminar a Língua Portuguesa do sistema de ensino básico em Timor-Leste.

Por razões eleitorais (2012) ou outras, a verdade é que a manutenção do português como língua oficial do país voltou a ser questionada, admitindo-se mesmo que deixe de o ser. A questão não é consensual mas, na verdade, o simples facto de haver quem questione o uso do português é só por si paradigmático.

Na altura, tanto quanto se sabia, Xanana Gusmão e Kirsty Gusmão, Embaixadora da Boa Vontade para a Educação e esposa do Primeiro-Ministro, foram os principais promotores da ideia. Compreende-se. Xanana que passou a comer, e bem, noutros pratos, já não se importava de cuspir naquele que o alimentou durante muitos anos.

Na altura, esta tese, mesmo que seja só embrionária e académica, pôs em causa o envio de mais de uma centena de professores de português, que nos últimos anos tinham assegurado o ensino da língua aos professores timorenses do primeiro ciclo.

Para Xanana Gusmão pouco ou nada interessava que esta vertente da cooperação absorva grande parte do esforço orçamental que Portugal reservava para Timor-Leste, principal destinatário da cooperação portuguesa no seio da CPLP.

E sendo a CPLP uma Comunidade dos Países de diversas línguas, entre as quais a portuguesa, não admirava que enquanto Timor-Leste queria abandonar o português, outros quisessem entrar, mesmo que o que pensam da nossa Pátria comum (a língua) seja igual a zero. Eram disse exemplos, em 2010, Austrália, Indonésia, Luxemburgo, Suazilândia e Ucrânia.

Domingos Simões Pereira, então secretário executivo da organização supostamente lusófona, precisou que a Suazilândia e a Ucrânia já tinham formalizado o pedido de adesão como membros associados, enquanto dos restantes três países, o Luxemburgo solicitou um “convite especial”.

Já em 2012 escrevi: «Nada como a CPLP estar preocupada, por exemplo, em ajudar os cidadãos ucranianos e esquecer – como tem feito até agora – os guineenses. É, aliás, simpático dar sapatos aos filhos do vizinho enquanto os nossos andam descalços…»

“Mas quando nós começamos a receber esta atenção e este nível de interesse por parte de países que ‘à priori’ não pareceria terem afinidades, interesses tão óbvios, isso deve alertar-nos para aquilo que a CPLP pode significar, para aquilo que pode representar”, acrescentou Domingos Simões Pereira.

E pelo que a CPLP parece representar, seria mais aconselhável mudar o nome para Comunidade dos Países de Língua Petrolífera. Esquecia-se a língua portuguesa, que é coisa de somenos importância, e apostava-se forte naquilo que faz mover os areópagos da política internacional: o petróleo.

Aliás, mesmo sem perguntar a Xanana Gusmão, todos sabem que a Indonésia é um daqueles países a quem a lusofonia tudo deve, mormente Timor-Leste.

Por alguma razão Jacarta proibiu, enquanto foi dona de Timor-Leste, aquilo que agora é, foi, será o desejo de Xanana Gusmão, ou seja, o uso da língua portuguesa.

Foto: Montagem a partir de uma foto de Paulo Novais / Lusa

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